Fonte: Coluna no GLOBO - Enviado por Míriam Leitão, Alvaro
Gribel e Valéria Maniero
Empresas reclamam de apagão de mão de obra. Brasileiros qualificados
procuram emprego. São barrados por não terem experiência, ou por serem mais
velhos, ou por não passarem nos burocráticos padrões de recrutamento. As
empresas perdem chance por discriminar. Falamos com desempregados e empresas
para entender as contradições do mercado de trabalho.
Fomos a campo usando as ferramentas das novas mídias.
Postamos no Twitter convites para que as pessoas com qualificação mas sem
chance no mercado de trabalho contassem as suas histórias. Gravei um vídeo
fazendo o mesmo convite, postei no blog, e foi chamado no site do Boa Chance.
Alvaro Gribel, Valéria Maniero e eu recebemos as histórias e conversamos
diretamente com alguns. Postamos casos no blog. Em quatro dias, recebemos mais
de 200 e-mails e 150 comentários.
Márcio Felipe é técnico em informática, com experiência em
empresas no Brasil e em Portugal. O setor de TI nos disse que tem carência de
100 mil pessoas. Ele procura diariamente emprego e não encontra. O que está
errado com ele? Dizem que é a idade: tem 45 anos. Mariana Cordeiro tem 28 anos,
é formada em marketing há seis anos e, durante esse período, está procurando
emprego. Mesmo sendo contra "panfletar" currículo, ela se cadastrou
num site especializado que enviou suas informações para 7.234 empresas. Recebeu
três respostas, mas sempre acabou ouvindo aquele desanimador: "você não
tem o perfil":
— Se os recrutadores dessem retorno, eu poderia saber em que
estou errando.
Ela continuará procurando e diz que se as empresas soubessem
"da disposição e desejo de várias pessoas como eu, pensariam duas vezes
antes de simplesmente descartar nossos currículos".
Renato Teixeira é engenheiro de transportes, tem 35 anos de
experiência, como o de ser diretor de Planejamento do Metrô do Rio. Não
consegue emprego porque tem 58 anos. Lucas Camilo formou-se em publicidade,
está fazendo um MBA na FGV, mas não consegue o primeiro trabalho. Dizem que ele
não tem experiência. Eduardo Azevedo é engenheiro eletrônico, com pós-graduação
na Coppe em sistema Offshore, faz mestrado na UFRJ em engenharia naval.
Trabalha em TI, mas seu sonho é trabalhar na área de petróleo. Ele não
consegue. O engenheiro Newton Amaro tem cursos de pós-graduação, 25 anos de
experiência, mas se diz barrado pela idade: 49 anos. No Twitter, vários nos
informam que as empresas em geral exigem 35 anos como idade máxima. Muita gente
não consegue sequer enviar currículo porque as empresas estabelecem essa idade
como limite. Quem tem 37 anos já seria "velho".
Atualmente, os jovens ficam mais tempo estudando, começam a
procurar emprego mais tarde, aí são barrados por não terem ainda começado a
trabalhar. Um me disse que aos 29 anos foi declarado "velho" numa
seleção. Alguns se formaram num período em que o mercado de trabalho estava
pior no Brasil. Foram para fora, hoje tentam voltar e não conseguem, apesar das
habilidades valiosas adquiridas no exterior, entre elas, o domínio de idiomas.
Oswaldo Cechinel ouve sempre elogios ao seu currículo e aos
seus 20 anos de experiência em cargos de gerência de empresas brasileiras e
estrangeiras. Mas não tem chance porque tem 64 anos. Ele não se sente velho e
acha sua experiência valiosa:
— Já tentei negociar salário, mas há muita discriminação
contra a idade.
Em Tocantins, Fernanda Souza do Nascimento, 28 anos, saiu da
faculdade de administração de empresas com mil planos na cabeça. Já enviou currículos para vários
tipos de empresas, mas recebe sempre a mesma resposta: não tem experiência:
— As empresas querem um profissional pronto, assim fica
difícil encontrar alguma coisa.
Barrados por terem idade demais, barrados por não terem
experiência, recusados pelo critério burocrático de idade máxima de 35 anos,
milhões de brasileiros estão neste momento cumprindo a mesma rotina: acordar de
manhã, pesquisar os empregos, mandar currículos, aguardar ansiosamente
resposta, se animar com alguma possibilidade de entrevista e ouvir do
recrutador que seu perfil não é o que a empresa quer. Isso vai demolindo a
autoconfiança e eles começam a achar que fizeram a escolha errada, ou têm algum
problema que não perceberam.
Não há nada de errado com esses brasileiros. Nas muitas
respostas que recebemos o que fica claro é que a empresa faz exigências
descabidas, constrói barreiras desprovidas de sentido.
Neuri dos Santos, com mestrado em química, manda diariamente
currículos para empresas, mas até agora nunca conseguiu um emprego com carteira
assinada. Só trabalho temporário num laboratório de uma universidade:
— Às vezes dizem que sou muito qualificado para a vaga.
Outras vezes perdi oportunidades por causa da idade. Não é porque eu tenho 37
anos que eu não posso continuar crescendo na profissão.
Conversamos com os departamentos de pessoal de algumas
empresas. O grupo Randon disse que tem 500 vagas em diversas áreas, 5% de
engenharia e nível técnico que estão há 80 dias sem preenchimento. O cenário é
o mesmo na Atlas Schindler, onde a convicção é que faltam técnicos no Brasil. A
mesma queixa ouvimos na Fosfértil. Um mês atrás fizemos a mesma busca em vários
setores e ouvimos as mesmas queixas.
O país está crescendo, o mercado de trabalho está dinâmico,
essa é a hora de as empresas abrirem suas portas, sem preconceitos. Hoje, já se
sabe que a diversidade é elemento essencial para a formação de uma boa equipe.
O Brasil está reclamando de apagão de mão de obra com oito milhões de
desempregados.
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