Suely Pavan
Talvez você já tenha lido um discurso recorrente e cômodo que diz: Falta qualificação, por este motivo não conseguimos contratar!
Na TV acompanho algumas matérias nos telejornais e vejo que existem empresas, como por exemplo restaurantes no sul do país, que simplesmente fecharam as portas em pleno verão porque não conseguem contratar garçons. Os donos de hotéis de algumas cidades de veraneio também estão com os cabelos em pé devido à falta total de recepcionistas. Segundo eles, mesmo aumentando os salários não há recepcionistas em seu mercado. Como gosto de pensar sobre as coisas me ocorre o seguinte: Se a recepcionista é temporária devido ao veraneio, por quê estes empresários não contratam pessoas de outros estados/cidades?
Às vezes falta gente num lugar e sobra em outro. E deve ser delicioso ser jovem e trabalhar por um período curto em outra cidade, preferencialmente as bonitas e com praias como as que apareceram na TV.
Chamou-me a atenção também os métodos para capturar pessoas mostradas na TV por estas empresas. Funcionários responsáveis pela contratação ficam esperando horas nos CAT (Central de Apoio ao Trabalhador) para que apareça um candidato apto, sem sucesso algum. Outros recorrem às velhas plaquinhas de “precisa-se” para recrutar pessoas. Em cidades como São Paulo e Rio de Janeiro ainda usam para recrutar apenas métodos tradicionais, sendo o principal deles a divulgação pela Internet.
Em momentos de crise de falta de pessoas, recrutamento precisa usar algo muito falado, porém pouco executado: a inovação. O recrutamento, que é o marketing da vaga, precisa ser previamente desenhado a fim de ir ao encontro do público alvo. Nem todo mundo também tem acesso à Internet ou vai ao CAT para buscar uma colocação. Ou seja, falta gente, mas os métodos de recrutamento continuam os mesmos! Recrutadores deveriam a meu ver conhecer marketing.
Na série de telejornais que assisti, uma das reportagens falava sobre os desabrigados em função das chuvas, e vi e ouvi pessoas dizendo: Não temos como sair daqui, porque estamos desempregados.
Ooops! Como assim?
Há vagas e as pessoas não sabem delas? Neste caso e apenas neste podemos pensar na falta de qualificação profissional, mas as matérias também dizem que há cursos gratuitos - só não dizem onde. Fui eu mesma procurar e nada encontrei de cursos para profissões em baixa, como padeiros, garçons, recepcionistas e pedreiros. Se eu, que tenho facilidade com o recurso da Internet, nada encontrei, imagine aqueles que nem sequer Internet possuem. Deveria haver campanhas nas comunidades, CATs, padarias, igrejas, cultos, entidades de ajuda à população carente e outros locais de domínio público dizendo quais os cursos profissionalizantes que são gratuitos. Mas quem quer se especializar ou até mudar de profissão não sabe muito a quem recorrer.
Acredito que às vezes falte para as pessoas a vontade de trabalhar, e para as empresas, existe uma falta de disponibilidade para investir. Querem contratar, sem gastar nada. Algo impossível nos tempos atuais. Porque os hotéis do sul do Brasil e as empresas de São Paulo e Rio de Janeiro não fazem uso de serviços de consultoria, por exemplo? Consultorias podem ser caras, mas garantem, quando são boas, gente igualmente gabaritada. Uma boa consultoria de Recrutamento e Seleção vai garimpar candidatos e dar feedback imediato às empresas quando, por qualquer razão, não se obtém o candidato desejado. Nestas ocasiões perfis são mudados, treinamentos prévios são encomendados, e o investimento continua.
É melhor investir em recrutamento e seleção do que gastar um dinheirão na contratação errada. Este jeito preventivo ainda parece uma novidade para os empresários brasileiros. Com esta atitude retrógrada, que mistura falta de investimento com absoluta falta de inovação, o Brasil poderá se “ferrar” de verde, amarelo, azul e branco nos eventos que surgirão nos próximos anos.
Todo mundo sabe há anos que existe um “gap” (lacuna) enorme entre o nosso sistema educacional, que é precário, e a demanda empresarial. Poucas, porém, são as empresas que investem pesado em treinamento. A solução é simples: Não encontro o profissional desejado? Eu treino. É assim que se sai do sufoco da falta de qualificação. Ela não pode servir de pretexto para a inoperância.
Óbvio que profissionais despreparados em recursos humanos como diretores, gerentes, supervisores e coordenadores não conseguem exigir investimentos e cegamente fazem aquilo que os clientes pedem. Alguns chegam ao absurdo de dizer que o cliente tem sempre razão. O ditado só pode ser verdadeiro quando se faz também uma leitura correta da realidade.
Exemplo desta cegueira generalizada é achar que os operadores de telemarketing, profissionais que viraram motivo de chacota social e que têm salários semelhantes a empregadas domésticas, são cargos que podem ser desempenhados por qualquer pessoa. Pura mentira! Deveriam ser melhor recrutados e selecionados, pois representam as empresas. E, claro, bem treinados, coisa que não acontece. A maioria apenas parece um pobre papagaio a repetir um “script”. Uma desumana afronta à saúde mental que se faz com estas pessoas. Para se tornar um operador de telemarketing, por exemplo, é preciso ter um repertório, falar corretamente e saber dar soluções. E por estas razões a ilusão de que “qualquer pessoa” pode ser um operador de telemarketing é perigosa!
Há muitos anos assisti a um seminário com James C. Collins, autor do livro “Feitas para Durar”. Num dado momento ele perguntou aos empresários brasileiros que lotavam a platéia qual é a área mais importante de uma empresa. As respostas de nossos empresários foram: T.I., finanças, vendas, logística. Collins, com seu jeito extrovertido, disse: Não, a área mais importante de uma empresa é Recrutamento e Seleção, ela é a base de toda uma empresa. A maioria dos empresários presentes franziu o nariz e debochou deste comentário de Collins naquele dia. Embora este evento tenha ocorrido há muito mais de 10 anos, acredito que nosso empresariado esteja ainda valorizando muito pouco esta área, e tampouco investindo nela.
Chega de barganhar para selecionar, é preciso tirar a mão do bolso! Quem se habilita?
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