Para fazer a pesquisa, os professores se apoiaram em sua experiência de coaches e em estudo empírico com diretores (741) e subordinados (2.111) de 18 países realizado pela Rede de Gestão Transcultural do IESE, instituição cujo objetivo consiste em promover a pesquisa intercultural no âmbito do comportamento humano nas empresas. De acordo com os pesquisadores, a análise de 2.848 respostas coligidas pelo estudo e uma série (de cinco a sete) entrevistas qualitativas com diretores de seis regiões culturais diferentes: países de língua inglesa, Europa ocidental, leste europeu, América Latina, área de influência do confucionismo e sudeste asiático lhes permitiu validar seu modelo teórico sobre a dinâmica da confiança no âmbito das empresas. O trabalho foi apresentado durante o Congresso Anual da Academia de Gestão (AoM) de 2009.
Os autores revelam em entrevista concedida ao Universia Knowledge@Wharton os pontos chaves para que as relações entre diretores e subordinados sejam baseadas na confiança e no pleno entendimento, gerando com um isso um ciclo virtuoso. Esse ciclo funcionaria da seguinte forma: quando o diretor se comporta de tal maneira que mereça confiança, os empregados confiam mais nele e se envolvem mais com seu trabalho e com a empresa. Isto, por sua vez, reforça a confiança de seus chefes neles, o que também facilita a disposição dos funcionários de adotar uma atitude merecedora de crédito.
Universia Knowledge@Wharton: Em que consiste a confiança no contexto empresarial?
Pablo Cardona: Fizemos vários estudos empíricos em que indagávamos aos trabalhadores em que consistia para eles a confiança em alguém. Ouvimos respostas do tipo:
“O que me leva a confiar em alguém é a preocupação constante dessa pessoa em atender às minhas expectativas de trabalho; a fidelidade aos seus compromissos e a colocação em prática daquilo que diz. Quando, porém, achar que não conseguirá fazer alguma coisa, que o diga e explique por quê.” (Mulher do setor de educação empresarial, 37 anos).
“Tenho confiança em quem responde a minhas mensagens e age com sinceridade num processo fluido de troca de informações.” (Mulher do setor de comunicações, 35 anos).
“A confiança é um sentimento de segurança que você tem ao compartilhar tudo com uma pessoa que vai responder às suas expectativas, porque que essa pessoa, quando assume um compromisso, o cumpre.” (Homem do setor de consultoria, 42 anos).
Há muitas outras respostas. Portanto, o denominador comum é a reciprocidade, transparência, lealdade, responsabilidade e o profissionalismo. São essas as atitudes que emergem em nosso ciclo virtuoso de confiança.
UK@W.: Que comportamentos promovem a confiança e que características a geram internamente?
Helen Wilkinson: São as seguintes as atitudes geradoras de confiança: coerência e previsibilidade (sem contradições e opiniões com fundamento); integridade (comportamento calcado em princípios éticos); comunicação aberta e fluida com os colaboradores (mentir nunca é uma boa opção); compartilhamento e delegação (que se traduz em uma motivação maior e com implicação pessoal); preocupação com os subordinados (a empatia é uma das competências que mais ajudam); e lealdade. A confiança se baseia na interligação de todos esses componentes.
UK@W: De onde vem a confiança? Quem a origina e como ela se transmite dentro da empresa?
Cardona: Todos na empresa podem ser geradores de confiança, porém a responsabilidade maior recai sobre a diretoria. Se ela gera confiança, fica mais simples estendê-la aos diferentes níveis da companhia. Caso contrário, resta aos trabalhadores confiarem uns nos outros, o que não é necessariamente positivo. Poderá até ser contraproducente, já que pode gerar um sistema defensivo “antagônico” à direção.
Como se transmite a confiança? Em primeiro lugar, através do exemplo: os diretores devem dar o exemplo fazendo aquilo que exigem dos demais e também o que dizem (sustentando as atitudes descritas na seção anterior). Em segundo lugar, através de políticas de avaliação real dos trabalhadores. Se os valores apregoados não são levados em conta na hora de avaliar as pessoas, falta coerência às políticas reais. Em terceiro lugar, por meio de decisões tomadas no dia-a-dia da empresa. Nesse momento, uma vez mais, as pessoas vão perceber se há consistência nas decisões tomadas. Por fim, através de uma comunicação eficaz em todos os níveis da organização no que diz respeito às intenções e decisões da empresa e das políticas por ela adotada.
UK@W.: Quais são as principais vantagens para e empresa?
Wilkinson: As pessoas e os departamentos passam a cooperar entre si como uma equipe integrada. Se não houver confiança, as pessoas se preocuparão só com as suas coisas, e não com o bem comum ou o interesse geral da empresa ou organização. O trabalhador deve pensar por si mesmo, e não esperar instruções. Ele se torna dono do seu trabalho e contribui com iniciativas que aportam valor agregado. Não receia ser penalizado se cometer erros, tampouco teme que alguém lhe roube as ideias, isto é, sua contribuição. Tudo isso influi e faz com que a empresa prospere e não fique atrelada a comportamentos herdados do passado num estado de inércia. É claro que essas coisas contribuem também para o aperfeiçoamento do trabalhador.
UK@W.: Quais seriam os sinais de um ambiente de trabalho onde reina a desconfiança?
Cardona: Depressões, ansiedades, faltas por motivo de estresse, rotatividade excessiva, existência de panelinhas nas várias áreas da empresa, falta de fluidez na informação.
UK@W.: Existem métodos para mensurar o nível de confiança das empresas?
Wilkinson: A confiança se estabelece entre pessoas. Com relação à empresa de modo geral, é preciso medir o grau de união e de identificação com a empresa que, por outro lado, é dada pelo exemplo dos diretores, das políticas de avaliação etc., bem como os exemplos citados anteriormente. Há estudos sobre a mensuração da cultura empresarial como, por exemplo: “Cultura empresarial: estudo empírico em empresas espanholas e portuguesas”, IESE-IRCO 2007. Esse estudo se preocupa com a mensuração do grau de união, e não só com o ambiente de trabalho.
UK@W.: As empresas se preocupam em medir, de algum modo, o nível de confiança?
Cardona: Ainda estamos muito longe disso. Não basta que se façam estudos de medição do ambiente de trabalho. Esses estudos, de modo geral, medem o grau de satisfação, e não a união. Eles medem as queixas. Contudo, já há empresas que trabalham com perguntas cujo propósito é o de medir a união atrelada à satisfação. Um exemplo de pergunta nesse sentido seria: “Sinto-me orgulhoso de pertencer a essa empresa?”
UK@W.: Dizem que há fatores que geram confiança e que podem ser trabalhados. Quais seriam esses fatores e de que maneira podemos modificá-los?
Wilkinson: A idade, o sexo e a raça não podem ser modificados. Já o prestígio e a credibilidade, sim. Sempre é possível aumentar o nível de conhecimento, de networking, honestidade e, portanto, ganhar em prestígio e credibilidade. Isso resulta, indiretamente, em fatores que não podemos alterar. Na China, por exemplo, uma executiva, só pelo fato de ser mulher, carece de imediato de confiança. Contudo, ela pode atenuar essa “deficiência” impossível de modificar por meio de conhecimentos e prestígio profissional.
Outro exemplo disso é a idade. Com o passar do tempo, há uma perda de energia. No entanto, nem sempre se trata de um dado negativo no caso do trabalhador jovem. Nos países do leste europeu, confia-se mais num chefe jovem do que num chefe mais velho.
UK@W.: A dinâmica da confiança é a mesma na Espanha e na América Latina?
Cardona: A dinâmica, basicamente, sim.
UK@W.: Quais são as semelhanças e diferenças entre os executivos dessas regiões e como isso influi na confiança?
Cardona: Os executivos latino-americanos têm mais dificuldade em confiar em seus subordinados. Por quê? Porque acredita-se que o trabalhador deva estar totalmente entregue ao seu trabalho. Na América Latina, as funções a serem desempenhadas não estão claramente delimitadas. Já nos EUA, a descrição do posto de trabalho é muito rigorosa e específica, portanto quando algum trabalhador vai além, fica mais fácil de perceber e de ser avaliado pelo chefe. Observa-se mais facilmente que ele foi além do esperado, que se dedicou de fato.
UK@W.: Quais são as implicações práticas dos resultados do estudo?
Wilkinson: Em primeiro lugar, a geração de ideias. Elas fluem num ambiente de confiança. Quando reina a desconfiança, há panelinhas, feudos, não há troca de informações, não se geram ideias, há paralisação e inércia. Se não há confiança, não há compromisso real. Sem isso, as reações mercenárias não deveriam surpreender ninguém, porque não era mesmo de se esperar que o trabalhador se preocupasse com o bem-estar geral da empresa.
Em segundo lugar, a confiança vai sendo construída e se fortalece com o tempo, mas pode ser facilmente destruída. É preciso atenção ao permitir determinadas atitudes durante os períodos de crise. Pode-se criar um ambiente em que se torna difícil restaurar a confiança. As decisões a serem tomadas devem se pautar pela coerência, integridade, pelo compartilhamento de informações no momento adequado nunca abrindo mão da preocupação real pelas pessoas e da lealdade. O mesmo vale, é claro, para os tempos de crise.
Fonte: Universia Knowledge@Wharton
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