Um excelente artigo do Professor Fernando Gonçalves.
Anos atrás assisti uma palestra sua em um congresso de RH em Recife, cidade em
que vive. O evento saiu muito da "caixinha" e provocou diversas vezes
a platéia, não acostumada a ouvir palavras e mensagens que não lhes fossem
favoráveis. Foi um dos primeiros contestadores do universo RH. Me
lembro que entre outras mensagens de igual teor, pediu para todos deixarem de
praticar a cultura do fingimento (finge-se que a área vai bem, finge-se que
toda a empresa respeita, finge-se que as atividades sempre vão de encontro às
necessidades dos trabalhadores e por aí vai). Segue o artigo e boa
reflexão!
"Outro dia, um não muito distanciado dos atuais, excessivamente
plúmbeos, o escritor
Umberto Eco, jornalista e professor de semiologia da Universidade de Bolonha, romancista de sucesso e consagrado autor de O Nome da Rosa, também de O Pêndulo de Foucault, foi entrevistado pelo jornal francês Le Monde. Sem papas na língua, denunciou uma estupidificante indiferença moral diante dos extremismos políticos que estão proliferando no mundo inteiro, mormente os de extrema direita. Para ele, as categorias "direita" e "esquerda", radical dicotomia de quarenta anos atrás, não são mais compatíveis com os instantes históricos do agora , dadas as novas circunstâncias das atuais realidades sociopolíticas.
Umberto Eco, jornalista e professor de semiologia da Universidade de Bolonha, romancista de sucesso e consagrado autor de O Nome da Rosa, também de O Pêndulo de Foucault, foi entrevistado pelo jornal francês Le Monde. Sem papas na língua, denunciou uma estupidificante indiferença moral diante dos extremismos políticos que estão proliferando no mundo inteiro, mormente os de extrema direita. Para ele, as categorias "direita" e "esquerda", radical dicotomia de quarenta anos atrás, não são mais compatíveis com os instantes históricos do agora , dadas as novas circunstâncias das atuais realidades sociopolíticas.
As últimas três décadas, aceleradamente evolucionárias, não devem
provocar indiferença nos portadores de uma criticidade avessa a dogmatismos e
ortodoxias. Distinções esclerosadas costumam "cegar", obstaculizando
reflexões desapaixonadas, desestabilizando emocionalmente os mais jovens e os
menos experientes. Ou os que, aturdidos pela velocidade da História, postulam a
validade de tudo, nada recusando, tudo sendo permitido, as regras morais mais
salutares não mais servindo como balizamentos comportamentais de
posicionamentos políticos, táticos e estratégicos.
Defende Umberto Eco, com a responsabilidade de ser um intelectual de
renome internacional, a missão de todo ser-pensante: delinear os limites entre
o tolerável e o não-tolerável. Segundo ele, não há "nenhuma verdadeira
diferença entre os ‘skinheads’ e os neonazistas de hoje e os nazistas da
geração anterior". E vai além: "Continua sendo a mesma forma de
imbecilidade e de atração pelo mal, o mesmo ódio pelos outros e o mesmo desejo
de destruição".
Num país onde a ética comportamental é ridicularizada pelos que apregoam
cinicamente saber levar vantagem em tudo, o pensamento desalienante deve
merecer um esforço continuado, redobrado mesmo, para poder discernir entre o
que se encontra ultrapassado, obsoleto, e o que é moderno, atualizado,
contemporâneo. E, ainda, o que foi considerado errado no passado e o que
continua errôneamente sendo feito nos dias de hoje, numa aldeia global de
múltiplos e cada vez mais interdependentes contextos tribais.
Acredito que nós, brasileiros, nordestinos, pernambucanos especialmente,
temos uma obrigação cidadã muito acima das agruras do cotidiano: o direito de
desconfiar das posturas políticas enganosas e das ruidosas esculhambações
sectárias dos messiânicos. O dever
de persistir reconstruindo os fatos históricos do nosso
ontem sob um prisma revisionista é característica maior de todo historiador
cientificamente idôneo, que não se permite resvalar para os negativismos
analíticos das conjunturas nunca estáveis. O próprio Umberto Eco, em sua
memorável entrevista, declara que "a Terra é redonda: não se pode ir à
esquerda demais". E explica: a força de perseguir a ideia mais extrema, a
mais provocadora, a mais "inovadora", acaba por dar a volta e se ver
situada na extrema direita. Os exemplos são centenas ao nosso derredor.
Preguiça, ignorância e incompetência, definitivamente, não são armas
para quem busca transformações sociais consequentes e duradouras. George Orwell
costumava dizer que os jovens intelectuais de classe média vão para a esquerda
por desemprego, sempre cobrando dos outros aquilo que não podem oferecer. Por
aqui, os mais exaltados são alguns fronteiriços, já efetivados nos seus cargos
públicos.
Numa conferência recente, alguém escreveu num flanelógrafo: “quando
quiser saber alguma coisa sobre jóias, não pergunte ao alfaiate, pergunte ao
joalheiro”. Eis o caminho mais realista, menos prejudicial, mais consistente.
Com apenas um porém: o consultado deve ser bom, mais que muito bom, ótimo,
inspirador de muita confiança, conhecedor pleno de uma realidade, a da sua
especialidade. Com os seus derredores."
*Fernando Antonio Gonçalves foi Secretário Estadual de Educação e Cultura de
Pernambuco e é pesquisador aposentado da Fundação Joaquim Nabuco, Membro
da Academia Recifense de Letras. Também integra o Conselho Diretor da Fundação
Gilberto Freyre. Também é articulista do Jornal do Commércio de Recife/PE. Editado em 2012
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Comentem, da discussão nasce a sabedoria!