Excelente artigo para iniciar bem a semana. Escrito há 9 anos atrás por Stephen Kanitz. Texto curto, objetivo, sensato e provocante. Boa leitura!
Stephen Kanitz
Você já teve a impressão de que seu chefe, seu supervisor ou
seus colegas de trabalho estão ficando menos inteligentes a cada ano que passa?
E que essa onda está afetando inclusive você? Que o mundo está cada vez mais difícil de entender? Se você está se sentindo cada vez menos inteligente, fique
tranqüilo, estamos todos emburrecendo a passos largos, inclusive eu. O conhecimento humano está
aumentando explosivamente. Antigamente, dizia-se que o conhecimento humano
dobrava a cada dezoito meses. Hoje, parece que ele dobra a cada nove. Embora
coletivamente o mundo esteja ficando mais inteligente, individualmente estamos
ficando cada vez mais burros.
Antigamente, você precisava entender de mecânica para
dirigir um carro. Hoje, os computadores são feitos à prova de idiota, graças a
Deus! É justamente por isso que sobrevivemos. Equipamentos incorporam
conhecimento, e muitas vezes tomam decisões por nós. Por essa Darwin não
esperava, pela sobrevivência dos menos inteligentes.
Se você ler três livros por mês, dos 20 aos 50 anos, serão
1.000 livros lidos numa vida, que nem chegam perto dos 40.000 publicados todo
ano só no Brasil. Comparado com os 40 milhões de livros catalogados pelo mundo
afora, mais 4 bilhões de home pages na internet, teses de doutorado, artigos e
documentos espalhados por aí, provavelmente seu conhecimento não passa de
0,0000000000025% do total existente.
Há intelectual que acha que tem o direito de mudar o mundo
só porque já leu 5.000 livros. É muita arrogância. A idéia de intelectuais
superesclarecidos governando nações hoje não faz o menor sentido, é até
perigosa.
Como sobreviver num mundo onde cada um de nós só poderá
almejar saber 0,0000000000025% do conhecimento humano ou até menos? O segredo é
cada um se esforçar para saber 100% de um pequeno nicho, uma parcela mui, mui
pequena do conhecimento humano.
Não basta mais tirar a nota mínima 5 em 58 matérias e achar
que um diploma vai resolver sua vida. Não basta mais saber 90% de uma única
matéria acadêmica. Você precisará saber 100% de algo que seja útil para os
outros. Você vai ter de ser o maior especialista do mundo num assunto e vender
o que sabe fazer bem aos demais miniespecialistas do planeta, e vice-versa.
Quantos alunos se formam especialistas em coisa alguma?
Infelizmente, as universidades hoje em dia produzem commodities. Preferem
formar generalistas, porque é bem mais barato do que formar especialistas.
Só que generalista que não tenha uma especialidade não
arruma o primeiro emprego. Faculdades oferecem basicamente o mesmo curso todo
ano, obedecendo a um mesmo currículo, chamado de mínimo. Não é à toa que há
tanto desemprego.
Antigamente, superespecialistas poderiam morrer de fome por
falta de mercado. Hoje, a globalização permite mercados cada vez maiores. Por isso
a enorme preocupação dos especialistas em ampliar mercados como a Alca, Brindia
e Mercosul. Um técnico de manutenção de rodas de avião morreria de fome no
Uruguai.
O segredo daqui para a frente é ignorar uma série de
leituras, publicações e jornais que você lia anteriormente, com exceção de
VEJA, para não parecer um ET. Curiosamente, você vai ter de se tornar um
ignorante, alguém que deliberadamente ignora milhares de informações para se
concentrar na sua especialidade. O segredo não é mais ser um intelectual que
sabe um pouquinho de tudo, mas ser um ignorante que sabe tudo sobre um
pouquinho.
Fonte: Revista Veja, Editora Abril, edição 1814, ano 36, nº 31 de 6
de agosto de 2003