quarta-feira, 15 de junho de 2011

O que é o apagão da mão-de-obra e como se manifesta?

André Ofenhejm Mascarenhas (Professor dos Cursos de Mestrado e Doutorado em Administração do Centro Universitário da FEI)
Fonte: Portal HSM
Professor da FEI explica duas maneiras que o apagão se manifesta: a indisponibilidade de recursos humanos e qualidade da formação.

O tão falado apagão da mão-de-obra é um efeito colateral do crescimento acelerado da economia brasileira. Este termo evidencia as dificuldades que a sociedade vem enfrentando com a oferta limitada de profissionais, dos mais diversos níveis de capacitação, diante das necessidades dos setores econômicos em transformação.
Trata-se de um fenômeno complexo, que incide de forma diferente nos variados setores, mas que tem uma raiz comum: as deficiências históricas de nosso sistema de educação, dos níveis mais básicos à educação continuada. De maneira geral, haveria duas formas de sua manifestação.

A primeira é a indisponibilidade de recursos humanos para fazer frente aos desafios do crescimento. Diante do dinamismo de setores que crescem a taxas chinesas, não temos dado conta da formação especializada dos recursos humanos necessários, apesar da forte expansão do ensino superior e da pós graduação. 
Um exemplo gritante é a formação de engenheiros, insuficiente a um país que está diante de oportunidades inéditas e que precisa dar uma guinada em sua infra-estrutura, o que impõe a algumas empresas estratégias extremas de provisão de pessoas, como a importação de mão-de-obra. Contudo, a indisponibilidade de mão-de-obra não é problema típico de setores mais tecnológicos.
A segunda forma de manifestação do apagão da mão-de-obra diz respeito à qualidade da formação de nossos recursos humanos. Entre os formados e teoricamente capacitados, muitos detêm competências limitadas devido às debilidades históricas da educação no Brasil. A recente universalização do ensino básico não teria sido suficiente para dotar os indivíduos de uma formação de qualidade.
O ensino médio é um gargalo na formação de nossos recursos humanos, e as empresas deparam-se com as limitações e imposições decorrentes desta situação: analfabetismo funcional, pouca autonomia dos profissionais, competências básicas insuficientes, e a consequente necessidade de incrementar o capital humano por meio de sistemas auto-centrados de educação corporativa.   

O apagão da mão-de-obra é um fenômeno complexo. Suas causas e manifestações são múltiplas e específicas, impondo desafios grandiosos a governos, empresas, instituições educacionais e sociedade civil em geral.
Contudo, nem todas suas manifestações poderiam ser consideradas disfunções ou resultado da falta de planejamento ou inação dos governos. Sintomas como a falta de mão-de-obra na construção civil e as dificuldades à contratação e retenção de técnicos especialistas em setores tecnológicos seriam consequências das profundas transformações pelas quais passam nossa economia e sociedade e, consequentemente, nosso mercado de trabalho. Transformações estas que trazem em seu bojo desequilíbrios, mas que podem indicar evoluções em direção a uma sociedade mais justa.

De fato, desequilíbrios são características da mudança social, complexa por natureza. No meio urbano, por exemplo, a própria expansão do ensino superior e o aumento da renda média da população transformam as expectativas dos jovens, que passam a ser disputados no mercado de trabalho e a rejeitar com mais facilidade trabalhos que consideram menos nobres.
No meio rural, o crescimento dos programas de transferência de renda desestimula o subemprego, ou pelo menos o torna mais oneroso ao que contrata, alterando tradicionais relações de poder. Ou ainda, a melhoria dos serviços públicos de saúde requer a difícil interiorização da carreira médica, impondo desafios a governos e entidades de classe.

O fenômeno do apagão da mão-de-obra tem diversas implicações às empresas e à sociedade. Em resumo, precisamos pensar em estratégias para minimizá-lo, ou ainda, torná-lo uma oportunidade. Tal como a natureza do problema, estas estratégias são múltiplas e multifacetadas, e passam por enfatizarmos uma virada na qualidade da educação no Brasil.
Precisamos fomentar relacionamentos entre os agentes econômicos e as instituições de educação e formação profissional. Temos que investir em ciência e tecnologia, e avançarmos na universalização do acesso à educação de qualidade, da pré-escola à pós-graduação.
Neste processo, as empresas devem reconhecer não somente a necessidade de implantar estratégias de curto, médio e longo prazo para minimizar os impactos do apagão, mas também, assumir sua responsabilidade à transformação da sociedade.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Comentem, da discussão nasce a sabedoria!