Monica McGrath, é professora adjunta de Administração da
Wharton e consultora da área de coaching. Segundo ela, diversos
profissionais da media gerência relutam cada vez mais em dar o próximo passo em
suas carreiras porque a escada corporativa já não é mais tão atraente como no
passado e o preço da escalada é alto demais.
“Essas pessoas continuam ambiciosas, e muito
empenhadas. Só que elas já não se empenham mais pelas mesmas coisas de 15 anos
atrás”.
Para ela e para outros especialistas, é possível que as
pessoas estejam definindo trajetórias profissionais com base em valores e
definições próprias de sucesso. Não se trata de indivíduos que já deram tudo de
si ou dispostos a abandonar o ambiente de trabalho. Eles não pretendem voltar à
escola, também não pensam em mudar de carreira e tampouco estão atravessando
uma crise de meia idade. O fato é que esses indivíduos estão repensando sua
contribuição para a empresa, agora sobre bases pessoais específicas. Em vez de
subscrever o lema “em frente e para o alto”, essas pessoas estão mais
interessadas em alcançar um determinado “platô”,
libertando-se com isso da pressão da escalada estabelecida por terceiros.
Inúmeras tendências muito freqüentes no local de
trabalho contribuem para a ocorrência desse fenômeno: os avanços tecnológicos
estão pondo por terra as barreiras entre as horas dispendidas dentro e fora do
ambiente de trabalho, aumentando a pressão para que o profissional esteja
sempre ligado ao trabalho ou de plantão. Decisões estratégicas como as de
reestruturação, downsizing e terceirização aumentam o grau de incerteza
profissional em todos os níveis, reduzindo o número de promoções disponíveis na
alta e na média gerências. O fluxo constante de mulheres que entram para a
força de trabalho contribui para elevar o estresse decorrente da necessidade de
equilíbrio entre vida profissional e vida pessoal.
O platô faz parte de um fenômeno que extrapola
as fronteiras da força de trabalho — e que inclui também a definição de
prioridades mais elevadas em um âmbito de atividades fora da esfera
profissional e que podem ocorrer no lar, em trabalhos voluntários ou na prática
de algum hobby.
A questão do trabalho excessivo, da necessidade
de realização de múltiplas tarefas, de ser obrigado a lidar com inúmeras
interrupções durante o expediente afeta a atitude do empregado, não só em
relação ao seu serviço, mas também em relação ao seu tempo livre.
Uma forma de analisar esse fenômeno, acrescenta
Nancy Rothbard, também professora de Administração da Wharton, recorre ao fato
de que alguns funcionários “ainda obtêm uma certa percepção de identidade
decorrente do trabalho ou estão em busca de outras formas de realização”. Já
não estão mais se esforçando para conseguir aumentos e não querem também um
quadro maior de subordinados (símbolo de mais prestígio). “Esses profissionais
estão desviando a energia, antes canalizada sobretudo para a consecução de
objetivos definidos pela empresa, e a estão direcionando para outras áreas”.
Peter Cappelli, diretor do Centro de Recursos
Humanos da Wharton, pesquisou em profundidade a natureza das mudanças no local
de trabalho. Conforme suas próprias observações e de outros estudiosos, di\ que
as empresas já não prometem mais estabilidade no emprego, pacote de benefícios
generosos e nem mesmo pensões, portanto os funcionários não se sentem na
obrigação de serem leais a seus empregadores, como tampouco se sentem obrigados
a permanecer na empresa por muito tempo. Esses indivíduos são responsáveis por
sua trajetória profissional e procuram consultorias e treinamento que possam
ajudá-los a progredir na empresa em que trabalham, ou em outra qualquer.
Cappelli também acha que as empresas “não têm
mais tanta influência sobre as pessoas como antigamente no tocante à fórmula
empregada para o delineamento dos seus objetivos e aspirações, em parte porque
as pessoas chegam a essas ocupações com uma certa idade, e mudam de trabalho
com mais freqüência do que no passado. Isto significa então que as pessoas
estariam criando sua própria trajetória profissional? Depende do que se queira
dizer com isso. Não creio que signifique que elas estejam rejeitando o sucesso
na empresa. Contudo, hoje mais do que no passado, esses indivíduos estão
avaliando o sucesso de acordo com parâmetros diferentes dos estabelecidos por
seu empregador atual”.
Cappelli adverte, porém, que é pouco provável
que um funcionário de desempenho “tranqüilo” acredite que será preservado e
valorizado por seu empregador. “Antigamente, bastava deixar correr em ‘ponto
morto’ e esperar pela aposentadoria. Isso já não ocorre mais com tanta
freqüência.” Embora alguns empregados já não dêem mais tanta atenção aos
objetivos colocados pela empresa, “continuam a dar duro porque receiam ser
demitidos […] É comum as empresas procederem a avaliações e demitir quem não
esteja fazendo sua parte. A capacidade de punir as pessoas e de obrigá-las a se
comportar conforme o esperado é uma das maiores lições, também uma das mais
desagradáveis, dos anos 80. O moral dos funcionários despencou e a
produtividade continuou alta, porque as pessoas tinham medo de ser demitidas”,
observa Cappelli, acrescentando, porém, que essa dinâmica muda em um mercado
cuja força de trabalho é escassa.
Sara Kaplan, outra professora de Administração
da Wharton, “imagina um cenário em que as pessoas descobrem que não faz muito
sentido ser leal a seu empregador. Elas raciocinam então da seguinte forma:
‘Muito bem, cheguei aonde podia chegar, portanto vou me concentrar agora em
outras áreas da minha vida. Continuarei a trabalhar, mas não investirei todas
as minhas energias no trabalho’”.
Todavia, Kaplan acredita também que “todos
precisam de algo que mexa profundamente com seu interior, portanto seria
difícil para mim imaginar que as pessoas simplesmente ponham seu trabalho em
segundo plano sem antes passar por uma crise ou descobrir outra coisa que possa
interessá-las". A verdade é que a economia atual, acrescenta Kaplan, “não
permite ao indivíduo manter seu emprego a menos que ele demonstre um certo
envolvimento. As empresas não querem em seus quadros pessoas que não estejam
dispostas a ir mais longe. Não querem pessoas que não se esforçam. Não dá para
ficar no platô. Há sempre alguém mordendo seu calcanhar”.
A questão da satisfação no trabalho está
diretamente relacionada com a questão do perfil desse trabalho. “Especialistas
em administração vêm estudando o assunto há bastante tempo”, observa Sigal
Barsade, professor de Administração da Wharton. “Sempre que uma empresa
estabelece as exigências de um trabalho, deve levar em conta de que modo o
funcionário vê esse trabalho, se o objetivo do empregado é progredir na
empresa, se o trabalho é fundamental em sua vida, e assim por diante. A empresa
pode se equivocar redondamente tentando reconfigurar uma função, tornando-a
mais enriquecedora, se não for isso o que o funcionário deseja”, principalmente
se a nova definição do trabalho exigir que o funcionário trabalhe mais.
Ainda segundo Sigal Barsade, professor de Administração da
Wharton, “O indivíduo está fazendo o que a empresa quer que seja feito? Se a
resposta for ‘sim’, e se a pessoa for competente no que faz, mas simplesmente
não deseja produzir mais do que produz, essa talvez seja uma situação
confortável, sobretudo em se tratando de funções que não dêem espaço para
promoção”. Isto se aplica principalmente a cargos relacionados com a prestação
de serviço ao cliente, em que as pessoas precisam de envolvimento na hora de
prestar serviço, mas não se espera delas que imaginem alternativas para a
reconfiguração de todo o sistema de atendimento ao cliente. “Portanto, a
adequação deve ocorrer levando-se em conta aquilo de que a empresa necessita e
aquilo que o empregado quer e valoriza”.
Kathleen Christensen, Consultora da Fundação
Alfred P. Sloan, diz que o desejo de alcançar um determinado platô de trabalho
e de permanecer nele “é parte natural da vida profissional, entretanto, nós o
ignoramos porque temos na mente a idéia de uma trajetória que requer uma
escalada constante”. Os psicólogos, diz Christensen, referem-se a diferentes
estágios do desenvolvimento humano. Um deles seria a chegada à meia idade, em
que se observa uma sensação de retribuição — um desejo de começar a dar
retorno, talvez de começar a cultivar outros em vez de se concentrar apenas em
suas próprias realizações. A idéia de platô pode ser desejável, diz
Christensen, uma vez que o funcionário terá a essa altura um bom conhecimento
da empresa. Ele provavelmente conhece os processos, é capaz de compartilhá-los
com outros e de orientá-los. Se o indivíduo estiver o tempo todo em busca de
autonomia, acabará tolhendo a cultura de equipe que toda empresa deseja ter.
Não importa como as pessoas definem seu
trabalho, acrescenta Christensen, “é preciso que tenham sempre objetivos que
norteiem seu desempenho e que sejam valorizadas com base no grau de satisfação
com que atingem os objetivos propostos. Contudo, é preciso que reconheçamos
também que em diferentes fases da vida das pessoas, é possível que definam os
objetivos de seu desempenho de formas ligeiramente distintas — seu ritmo pode
ser diferente — e ainda assim enquadrar-se nas necessidades da companhia para a
consecução de seus objetivos empresariais”.
De acordo com Christensen, o conceito de platô
não tem origem única, e pode resultar de determinados acontecimentos na vida do
indivíduo — como o nascimento de uma criança ou a necessidade de cuidar do pai
ou da mãe doentes —, o que leva o empregado a decidir “a se manter onde está,
sem pensar em subir mais”. Contudo, “seria um erro supor que todos os fatores
que conduzem a ritmos diferentes de trabalho decorrem apenas de fatores
externos. Pode ser simplesmente decisão do funcionário não subir mais” na
empresa. Isto não significa que ele esteja acomodado. “Uma pessoa pode dar duro
e ainda assim conservar-se profissionalmente em um platô”, observa Christensen.
Ela enfatiza a necessidade de o empregador e o
empregado comunicarem um ao outro suas expectativas e objetivos. A decisão de
permanecer no platô, seja por quanto tempo for, deveria ser “uma transação
estruturada de tal forma que atenda às necessidades de ambos os lados. É
perigoso quando o empregado pensa que pode tomar a decisão baseado apenas no
que deseja fazer. Também é perigoso para a empresa se ela não leva em conta do
que o empregado necessita par dar o melhor de si. Tudo se resume a princípios
de boa administração”.
Stewart Friedman, outro professor de
Administração da Wharton, dá aulas para os alunos do programa executivo de MBA
da Wharton, além de outros cursos, e também acha que “as pessoas estão se
perguntando com o que de fato se importam e como devem mensurar seu sucesso.
Creio que um número maior de pessoas, não apenas os funcionários de meia idade,
mas também indivíduos mais jovens, estão levantando questões que não levantavam
20 anos atrás. Seria porque um número maior de pessoas estaria se incorporando
à pirâmide e com isso aceitando a realidade de expectativas menos ambiciosas
decorrentes da menor mobilidade vertical, ou será que fazem parte de uma onda
maior de nossa cultura mais centrada em outras definições de sucesso além da
definição puramente econômica? Acho que, provavelmente, trata-se das duas
coisas”.
O que torna um líder eficaz em uma empresa, diz
Friedman, é que ele é capaz de perceber que seus funcionários cultivam valores
diferentes do workaholic típico — gente que adora trabalhar 80 horas por semana
— e mesmo assim dá sua contribuição à empresa. “Contudo, é difícil mudar normas
e valores culturais profundamente arraigados.” O que Friedman descreve como
“excessos de uma geração que trabalha além da conta” chegou a um ponto em que
“um número cada vez maior de pessoas começa a questionar a dedicação exclusiva
ao trabalho. Cresce a quantidade de pessoas que busca alternativas criativas. A
grande interrogação 20 anos atrás era saber quem começava a trabalhar mais
cedo, já durante o café da manhã. Hoje, a grande questão é saber para onde o
indivíduo viajou nas férias e se ele foi para bem longe”.
Voltando à Monica McGrath, professora adjunta de
Administração da Wharton, o estresse no local de trabalho, de acordo com
diversos especialistas, pode aumentar em decorrência dos avanços tecnológicos
que tornam mais difícil para as pessoas se desligarem completamente do trabalho
na hora em que devem fazê-lo, como nas férias, por exemplo. Conforme explica
McGrath, “não há limites para o tempo do funcionário. Ele está sempre
disponível”. McGrath trabalhou com coaching em cinco empresas de grande porte
no ano passado e, em todas elas, notou a existência de volumes de trabalho que
considerou impraticáveis. Alguns funcionários, diz ela, reagem tentando
estabelecer limites rigorosos para o contato profissional — por exemplo, não
respondem ao Blackberry das 6 da tarde às 6 da manhã. “São pessoas que chegaram
à conclusão de que jamais conseguirão fazer tudo que lhe pedem e tampouco farão
felizes aqueles que as cercam.”